Dois anos após crise do oxigênio no AM, projeto ajuda na alimentação de crianças órfãs da Covid-19

Há dois anos, o Amazonas começava a viver a crise do oxigênio, quando faltou o insumo em todas as unidades de saúde para atender pacientes internados com Covid-19. Desde então, um projeto de Manaus passou a dar apoio alimentar à crianças que perderam os pais para a doença.

No dia 14 de janeiro de 2021, o estado registrava recorde de internados com Covid-19 e os hospitais ficaram superlotados devido a falta de oxigênio. Do lado de fora, ambulâncias chegavam a todo o momento e os familiares recebiam as notícias que seus parentes internados não haviam sobrevivido.

Investigações do Ministério Público e da Defensoria Pública apontam que mais de 60 pessoas morreram em todo o estado por conta da falta de oxigênio, entre as milhares vítimas da doença durante todo o período de pandemia.

Em meio ao caos, o Instituto de Pesquisa e Ensino para o Desenvolvimento Sustentável (IPEDS), criou o projeto “Eu Amo o Meu Próximo”, com o intuito de dar apoio alimentar às crianças que ficaram órfãs devido a Covid.

“São crianças que perderam os seus provedores e ficaram sem sustento para viver. Foi daí que surgiu o projeto para amparar essas crianças de imediato, de maneira emergencial, com alimentos para que viesse a suprir as necessidades alimentares deles no momento”, disse a coordenadora do projeto, Glauce Galúcio.

Ao total, o projeto apoia 200 crianças que foram adotadas por outros familiares, com doações mensais de alimentos.

Uma delas, é a pequena Celena, que nasceu durante a crise do oxigênio vivida no estado e foi adotada pela tia, Albilene Brito. A mãe de Celena teve complicações após testar positivo para a Covid e o parto precisou ser feito quando ela ainda estava com seis meses de gestação.

“Foi quando decidiram tirar a Celena, pois ela já estava com mais chance de sobreviver do que a mãe. foi uma correria porque ela tinha 38 anos, saudável, só tinha a gravidez. A filha ficou no instituto da mulher, a mãe na maternidade Balbina Mestrinho. Foi quando no dia 16 de fevereiro a mãe veio a óbito e fiquei responsável pela Celena, a pedido da minha irmã”, lembrou Brito.

Por ter nascido prematura e abaixo do peso, Celena precisou ficar internada por dois meses, aos cuidados de Albilene. Foi quando a unidade de saúde indicou as duas para o projeto “Eu Amo o Meu Próximo” e elas passaram a receber o apoio do instituto IPEDS, com alimentos todos os meses.

Ela afirmou que, sem essa ajuda, ela não saberia como iria cuidar de Celena após a saída da maternidade.

“Desde a maternidade, quando o instituto apareceu lá para ajudar, eu levantei as mãos aos céus e agradeci. Desde lá, a gente vinha pegar leite, fralda, lenço, rancho. Sem essa ajuda, não conseguiria manter ela e acredito que ela não teria nem ganhado peso devido a má alimentação que daria para ela”, contou.

Celena nasceu com seis meses de gestação e não não resistiu após testar positivo para a Covid. — Foto: Michel Castro/Rede Amazônica

Celena nasceu com seis meses de gestação e não não resistiu após testar positivo para a Covid. — Foto: Michel Castro/Rede Amazônica

Hoje, a situação difícil vivida pela família durante a crise do oxigênio é vista por eles com saudades da mãe, nesta data, que será lembrada todos os anos.

Mas hoje, Albilene vê a convivência, a vida de Celena e a ajuda do instituto como uma bênção para ela seguir cuidando da tarefa especial deixada por sua irmã.

“Na medida que foi passando o tempo, cada sorriso que ela tinha, cada olhar. hoje em dia ela chama de mãe. isso é um presente de deus. eu entendi que a Celena é um presente de deus. Eu não esperava, já estava com um bebê pequeno, mas a chegada dela hoje é um presente de deus. Ela é minha filha. não importa se não nasceu de mim, mas é minha filha de qualquer jeito”, concluiu.

O caos dos dias 14 e 15 de janeiro

Nas primeiras horas do dia 14 de janeiro, profissionais de saúde e familiares de pacientes saíam de dentro dos hospitais em desespero, relatando que havia acabado o oxigênio dos hospitais. Foram dois dias sem oxigênio, ou quase nada, nos hospitais.

A situação foi constatada nos principais hospitais de Manaus, como Hospital 28 de Agosto, Hospital Universitário Getúlio Vargas, Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado, e Serviços de Pronto-Atendimento (SPA) pela cidade.

Em meio à falta do insumo, pacientes morriam asfixiados nas unidades. A urgência por oxigênio era tão grande que pessoas passaram a comprar o insumo por contra própria, e levavam às pressas para os hospitais, na esperança de salvar seus familiares internados.

O consumo médio de oxigênio por dia, que era de 14 mil metros cúbicos, cresceu abruptamente, atingindo uma média 76,5 mil metros cúbicos. A capacidade de produção das empresas fornecedoras era de 28,2 mil metros cúbicos, na época.

Parentes de pacientes hospitalizados se reúnem para comprar oxigênio e encher botijões em empresa privada em Manau — Foto: REUTERS/Bruno Kelly

Parentes de pacientes hospitalizados se reúnem para comprar oxigênio e encher botijões em empresa privada em Manau — Foto: REUTERS/Bruno Kelly

A corrida por oxigênio provocou filas gigantescas na frente nas empresas fornecedoras, porém, faltou o insumo até para vender. As empresas tinham que dar prioridade ao fornecimento a hospitais.

Como os hospitais estavam lotados, muitos pacientes permaneceram internados em casa, sobrevivendo com cilindros de oxigênio. Nos hospitais particulares, também faltava o insumo. E, nos dias seguintes, a crise do oxigênio se estendeu para municípios do interior.

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